Coluna #3 – Longevidade
Lasse Koivisto, colunista PASA e AMS
Não se engane. Apesar da explosão recente de especialistas no mundo da longevidade, a verdade é que ainda sabemos muito pouco. Temos bons princípios, sim. Mas temos muito — muito — mais dúvidas do que respostas. É justamente por isso que a nutrição continua sendo um dos temas mais debatidos, polarizados e, ao mesmo tempo, promissores da ciência da saúde.
Dentro desse campo confuso, uma verdade merece destaque: os alimentos integrais carregam uma complexidade e uma potência que seus componentes isolados muitas vezes não replicam.
Talvez você não saiba, mas meu principal hobby é a cozinha. Tenho uma biblioteca de livros sobre o tema e passo boas horas do meu tempo livre testando receitas. E quanto mais eu estudo — com autores como Dan Barber, Harold McGee ou Nathan Myhrvold — mais fica claro que comida de verdade é algo que vai muito além de proteína, gordura e carboidrato. Ela é técnica, cultivo e muito mais é claro. Mas também é memória, vínculo e prazer.
Por isso falo com cuidado quando o tema é alimentação. Mas hoje quero ser claro: existe valor objetivo em priorizar alimentos integrais. E um estudo publicado em 2021 no Journal of Strength and Conditioning Research, com participação de Andy Galpin, ajuda a mostrar por quê.
O estudo que comparou ovo inteiro e clara
Você já deve saber que manter ou ganhar massa muscular é um dos pilares da longevidade. Para isso, consumir proteína suficiente é essencial. Mas e se a pergunta for mais refinada? Se o objetivo for maximizar os efeitos do exercício, faz diferença comer ovos inteiros ou só as claras, desde que a proteína total seja a mesma?
Quer saber mais sobre longevidade?
Inscreva-se no e-mail semanal gratuito Longevidade News, produzido pelo Lasse.
Assine AQUI.
Essa foi a questão central de um ensaio clínico de 12 semanas com 30 homens jovens, todos treinando resistência há pelo menos um ano. Divididos aleatoriamente em dois grupos, um consumia 3 ovos inteiros após o treino. O outro, 6 claras, igualando o teor proteico.
Ambos os grupos treinaram da mesma forma, com alta supervisão. A ingestão calórica e de macronutrientes também foi semelhante. A única diferença estava no que era consumido após o treino: alimento integral ou componente isolado.
Força, testosterona e composição corporal
Ao final do estudo, os dois grupos ganharam massa muscular nos quadríceps, aumentaram potência anaeróbica e reduziram cortisol. Mas os resultados mais marcantes ficaram com o grupo dos ovos inteiros:
- Mais força muscular: +11,2 kg na extensão de joelho contra +8,6 kg no grupo das claras; +7,3 kg e +6,2 kg de força de preensão nas mãos esquerda e direita, contra +4,8 kg e +4,3 kg;
- Menor percentual de gordura corporal: Redução de 2,7% contra 1,7%;
- Aumento significativo de testosterona: +2,4 ng/ml no grupo dos ovos inteiros contra apenas +0,7 ng/ml nas claras.
Houve ainda uma tendência estatística (p = 0,06) de maior ganho de massa magra no grupo dos ovos inteiros. Nada foi feito de diferente, além da escolha de como consumir os ovos.
A complexidade que só o alimento integral oferece
A explicação não está apenas na proteína. Está na matriz completa do alimento. O ovo inteiro carrega uma combinação sinérgica de micronutrientes, ácidos graxos, colesterol, fosfolipídios e compostos bioativos que trabalham juntos.
Andy Galpin, um dos autores do estudo, disse em conversa com a Rhonda Patrick que eles próprios ficaram surpresos com os resultados. Afinal, proteína e calorias estavam iguais. Mesmo assim, o grupo dos ovos inteiros apresentou mais ganhos. E como ele mesmo resume: “Whole food is always the answer”.
Se fosse só pela leucina — o aminoácido sinalizador da síntese proteica — a clara já daria conta. Mas o corpo responde ao todo, não apenas à soma das partes. Micronutrientes como a vitamina D, o ácido fosfatídico, o colesterol e até microRNAs presentes na gema podem ter um papel no ambiente anabólico. E embora os mecanismos ainda não estejam totalmente claros, o resultado está lá, medido e publicado.
Um lembrete sobre suplemento vs. comida
O próprio Galpin foi direto: “Você não precisa de suplemento de proteína para nada”. Muitos atletas de elite que ele acompanha não usam nenhum tipo. Não gostam, não digerem bem, e não veem benefício prático. Há casos e contextos, claro. Mas para a maioria das pessoas, o alimento integral funciona melhor — e ainda traz prazer e cultura.
Não é preciso radicalizar. Mas o estudo reforça o princípio “comida primeiro”. Antes de buscar o isolado mais puro, o peptídeo mais biodisponível ou a cápsula do momento, vale olhar para a simplicidade nutritiva de um alimento de verdade.
É um lembrete: o alimento integral da natureza foi projetado com sabedoria. E a ciência está apenas começando a entender por que o todo, muitas vezes, funciona melhor do que a soma das partes.
Lasse Koivisto é membro da Healthy Longevity Medicine Society e mentor de diversas startups. Em 2020, iniciou um estudo aprofundado sobre longevidade e, recentemente, deu início ao projeto Alpha Origin, no qual publica semanalmente artigos que têm como propósito ajudar as pessoas a viverem mais e melhor na newsletter Longevidade News.
Em 2025 se tornou o primeiro colunista dos canais de comunicação das operadoras de saúde PASA e AMS em uma parceria para trazer mais informações aprofundadas e seguras para nossos beneficiários.